sábado, 11 de maio de 2013

Poesia A Memória de Luiz De Quadros Gomes


A MEMÓRIA DE LUIZ DE QUADROS GOMES - MIGUEL ARNILDO GOMES

Num dia cinco de novembro
partiu e deixou saudades
que me arrebata, me invade
ferindo-me a própria alma,
a o  raciocinar com calma
porque  a vida é assim?
Na ficção ou na poesia
eu penso que bom seria
que tudo se eternizasse
e que tudo de bom que nasce
permanecesse vibrante,
como um astro radiante
e que jamais tivesse fim...
Fostes meu irmão mais velho,
meu professor , meu padrinho,
que ao longo de um só caminho
me destes ensinamentos,
ao lembrar neste momento
os primórdios de minha infância,
dos meus sonhos de criança
em aprender escrever,
me ofereceu o “Queres ler,”
a tabuada e o catecismo,
me deu aulas de civismo
e o verso tosco e caipira
aprendi não é mentira,
na mais cabal realidade
na pureza da verdade
e na magia do saber.
Recordo o cachorro Cairú
que tu levavas na carroça
quando seguias para a roça
com o Galante e o Barão,
bois de nossa estimação,
também o Gaúcho e o Navalha.
Se a emoção não atrapalha
eu termino este relato,
a ser coerente e sensato
na expressão sentimental,
coisa  vulgar ou banal
mas que pra mim tem sentido
sem deixar despercebido
na simples dedicatória
 a esta longa trajetória
que cumpristes até o fim.
Hoje renasces em mim
ao  usar de um só dialeto
a saudar tua esposa, filhos e  netos
e toda a família afinal...
em tua memória me ajoelho
pra continuar um pouco meu espelho
te tornarás imortal.
Lembro o cavalo Rosilho
que papai te deu de presente.
Tu saías imponente
nesse pingo marchador,
com garbo e muito amor.
Fostes professor,depois viajante,
improvisador vibrante,
de bons livros fostes leitor,
também fostes vereador
em algumas legislaturas
é como traçar a pintura
na tela da imaginação
é como ligar o coração
nos cordéis da profecia,
tua imagem se irradia
no lamiré da severidade,
misto de rigidez e bondade
misto de bronco e letrado,
por alguns idolatrado,
por outros , mal entendido,
corajoso , destemido,
audacioso e perspicaz
LUIS DE QUADROS GOMES DESCANSE EM PAZ NA INVERNADA DO SENHOR!!!

Poesia Ecos de um Tropel


ECOS DE UM TROPEL - MIGUEL ARNILDO GOMES

Na serração tensa, no ruído de galhos,
Nas gotas de orvalho, em uma manhã
Lagoa dos Patos, serena e tão linda
E belezas infindas do Rio Camaquã

Caramurus chegaram
Para um encontro mais serio,
Guardiões do império
Como Moringue na frente,
Jamais saberiam que sobre o estaleiro,
Havia carpinteiros e homens valentes.

Atira Procópio, que isto nos pertence,
Aqui alguns Riograndenses
E da outra banda,
São cento e cinqüenta imperiais,
Giuseppe falou que estes negros valentes,
Foram os melhores e os mais fieis.

Garibaldi ativante
Batizado no Pampa,
Que até pela estampa
Se configurava,
“Sonhador de dois mundos”
Visionário crescera,
Libertário que era
Por esta terra que amava.

Na estância do brejo
Neste encontro de guapos
O estandarte farrapo
Se glorificou,
Na peleja mais tensa
Sem ficção e sem jaça,
O ideal de uma raça
Se imortalizou.

Poesia Atalaia


ATALAIA - MIGUEL ARNILDO GOMES


Atávicos sonhos se desvenda,
Contenda sem mancha ou cicatriz
Inúmeros feitos e lendas,
Legenda de pátria e de raiz.

Tropeada dos dez anos, um só fato ,
Relato que lineou a trajetória,
Do prumo que sem pompa ou aparato,
Traçou um novo rumo pra historia.

A homologia nos traduz neste momento,
O Neto, o Bento e os distintos amarais,
Nunes Garboso comandante dos lanceiros
Como escudeiros pra notáveis imortais.

Hoje ao cruzar no cemitério do Cordeiro,
Com cerração que encobre uma manhã,
Ouço ao longe o clarim de Antonio Ribeiro,
Junto ao murmúrio das águas do Camaquã.

Onde ficções e ideais se entreveram,
Nossa bandeira andeijou serra e cochilhas,
Nesta tenência a própria raça se tempera,
Como centauros vanguardeiros farroupilhas.

Poesia Índia Anaí


ÍNDIA ANAÍ - MIGUEL ARNILDO GOMES

Aquele marco plantado
Na colina do Caiboaté,
Comprova que índio Sepé
Sem fazer ostentação
Pra defender o seu chão
Ao sair de São Miguel
Rumo a São Gabriel
Morreu com lança na mão.

Anaí, quanta ousadia,
Audaciosa e caborteira,
Formando a mesma carreira
Ao deixar na taba o filho
Percorrendo o mesmo trilho
Quando a cruzar por ali.
China intrépida, ignorante e sedutora,
Quando um dia também fora
A mais bela cunhataí.

Ela partiu pelo fator verdadeiro,
Quando no afã de servir guerreiros
Canta, grita, chora e ri.
Quanta fraqueza
Em um imensurável frenesi,
Liderando outras chinas
Sobre brenhas campos e campinas,
No rumo a Itusaingô
Onde um dia também tombou
Ela, a tapejara índia Anaí.

Quanta rudeza,
Quando a conduzir-se em um só tropel
A ser amarga como o fel
Somente sendo fiel
Ao seu deus Tupã e mãe Tupanci.
Sobre a flor da corticeira
Que crescera no banhadal
Ao tornar-se imortal
Ficou morando pra sempre, a Anaí.

Cunha valente,
Que ao próprio amor não se apega
Disparando por entre as macegas,
Dessa situação não reclama.
Quando ela, a índia Anaí
Símbolo de cunha guerreira
Junto ao um pé de corticeira
Foi devorada pelas chamas.

Salve, salve Anaí!!!
Cunhataí, depois cunha guerreira.
Salve a índia missioneira ,
Salve o bugre, xucro e nu.
Salve, salve Tiarajú
Salve Sepé redivivo.
Salve Andrezito altivo
Nosso André Taquari
Neste culto de emoções
Salve o mártir das missões.
Salve o pagé do momento,
Salve o rodeio dos ventos.
Mil vezes, salve, salve, salve
Anaí!!!

História Não-Me-Toque de Ontem e Hoje


NÃO ME TOQUE DE ONTEM E HOJE - MIGUEL ARNILDO GOMES

 De um lado verdes campos cobertos por capim barba de bode, onde sobre o orvalho das lindas manhas rebanhos e mais rebanhos de emas (ou nhandus) passeavam, onde os perdigões emitiam contagiantes assovios, procurando fazer dueto ao belo canto das seriemas. Na copa, no alto dos angicos, gaviões das mais diversas espécies emitiam ruidosos gritos, atemorizando a belíssima jacutinga, que com seu sonoro canto saudava o renascer de mais um dia.
Sobre forquilha das mais variadas aroeiras, caneleiras, erveiras, campuatãs... muitos casais de Barreiros (João de Barros), arquitetavam suas resistentes casas, usando-se para isso apenas argila intercalados a uma pequena mescla de palha. O que segundo o poeta com a porta de esguelha para o norte, para melhor proteger-se do vento minuano ou chuvas frias, que sopram do quadrante sul durante os meses hibernais.
No decurso das estações mais quentes, os vaga-lumes ou pirilampos com suas luzes fosforescentes, proporcionavam a singeleza nativa, o mais pinturesco painel ao pintar-se a tela das noites sombreadas, onde corais de rãs quebravam o silencio com a mais surpreendente orquestra sinfônica que a natureza nos brindou.
A uma milha e meia da itinerária brasileira para o sul e menos de uma milha para o oeste, podia ver-se extensas matas cobertas pelas mais diversas arvores nativas, tornando-se visíveis por entre elas gigantescos pinheiros araucárias, árvore também símbolo da região. Matas cujo habitat natural, abrigavam centenas de espécies de pequenos e médios animais silvestres e anfíbios, e ainda a mais numerosa variedade de pássaros que ao habitar nesta sobejidão, os papagaios talvez constituíssem como a força mais barulhenta, voando a média altura e em bandos por demais numerosos, tornando-se incontáveis numa algazarra inconfundível, como o que implorando para que aquela liberdade jamais viesse a se extinguir. Nesta circunstancias segundo a tradição precisamente familiar, o que nos foi transmitido pelos nossos bisavós, avós, pais e que hoje estamos repassando a nossos filhos e netos, e possivelmente a outras futuras gerações.
Foram décadas de pesquisa, e a que conclusão cheguei! Que aproximadamente no ano de 1848, isto é, um pouco antes da virada da primeira para a segunda metade do séc. XIX, chegaram a esta terra, oriundos da cidade de Ponta Grossa - PR, o casal Possidônio Ribeiro de Santana Vargas e Plassidina da Rocha Vargas. Ali estava o sonhador filho homem de Miguel Vargas e Maria Angélica. Adquiriram terras cuja primeira sede construíram muito próximo, onde situa-se a cidade de Não Me Toque, na saída para Carazinho. Possidônio e Plassidina vieram acompanhados alem de filhos ainda crianças, alguns negros escravos, bem como outros peões e agregados, quando construíram casa, galpões, mangueira de lascão e cochos cavados a partir de volumosos troncos de árvores, que serviriam para dar sal aos animais. Esta sede segundo se comentava situava-se a 45 minutos a pé até chegar ao local onde construiu-se mais tarde a Paróquia Cristo Rei de Não Me Toque. Nesta querência Possidônio e Plassidina viram crescer os filhos Antônio, José, Miguel (Varguinha), Pedro (Pedruca), Ambrosina e Ana Maria (Inharinha).
Possidônio foi um dos primeiros estancieiros a povoar campos nesta região, quando tinha como lindeiro entre outros, o Capitão Bernardo Antônio de Quadros e Felicidade Maria Xavier, este casal, a partir 1956, passou a povoar com seus rebanhos, a fazenda Bom Sucesso, que era sede da Invernada Grande e que situava-se entre os rios denominado Colorado ou Puitã e Arroio Cotovelo, que também na época denominado Puitãzinho. A amizade adquirida entre o senhor Possidônio e dona Plassidina com o casal Bernardo e Felicidade, tornou-se ainda mais ativo, quando os filhos possivelmente Antonio Ribeiro de Santana Vargas e Maria de Jesus de Quadros contraíram casamento no início de 1871. Possidônio, pessoa bastante comunicativa e dotado de alguns conhecimentos escolares, havendo conseguido ao transcorrer destes anos, cativar belas amizades entre fazendeiros do interior de Passo Fundo, bem como entre seus peões e alguns nativos remanescentes e ainda pela maneira amistosa que tratava seus escravos.
Mas foi mais ou menos nesta época, quando Possidônio julgava que sua paz ainda ia se perpetuar por um bom tempo, que veio o grande impasse, pois dona Plassidina juntamente com as duas filhas Ambrosina e Inharinha, já crescidas, começaram a pressioná-lo no sentido de mudar de residência. Talvez pelo motivo desta fazenda estar situada a uma razoável distancia de outros fazendeiros, que já se aglomeravam em torno do futuro arraial de Carazinho, onde a família Vargas já havia adquirido uma gleba de terras. Como Possidônio já havia contraído uma certa paixão pela sede, que com tanto amor construíra, por algum tempo ainda conseguiu resistir, mas dado a insistência continua dos familiares, Possidônio em determinado momento, reuniu esposa, filhos e principalmente as filhas, quando as ponderou:
- Posso até distribuir em vida a terra para vocês em outros locais, mas com a seguinte condição, daqui vocês não me toquem.
Foi a partir de então que a antiga sede passou a ser chamada pelas filhas Ambrosina e Inharinha carinhosamente como “Não Me Toque do papai”. Popularizando-se mais tarde principalmente entre as famílias Martins e Xavier de Quadros, já ligados a família Quadros por laços de parentesco, como sendo então “Não Me Toque de Seu Possidônio”. A repercussão foi tão imediata em toda a região, quando tropeiros oriundos destes rincões, a repontar mulas para a feira de Sorocaba – SP, ao confrontar-se com colegas tropeiros provenientes de outras paragens, principalmente peões Birivas, quando descendo de São Paulo ou do Paraná, muitas vezes se entreveravam aos peões gaúchos em rondas ou pousadas, mas quando referiam-se ao nome do lugar causava muita admiração e curiosidade entre os colegas, tornando este nome “Não Me Toque de Seu Possidônio”, conhecido em muitos rincões da província, bem como entre outros estados.
Comenta-se ainda sem se saber o dia, mês ou ano mais que foi possivelmente no final da década de 1860 que Possidônio, contrariando a qualquer desejo seu, mudou-se da sede de Não Me Toque com a família, passando a ser responsável direto, juntamente com a esposa Plassidina e principalmente Pedro (Pedruca), para formação do Arraial de Carazinho.
Já no final do séc. XIX foi criado por visionários na sua maioria descendentes germânicos, muito próximo aquele local a Colônia do Alto Jaqui. Não Me Toque mesmo deixando de ser de seu Possidônio jamais deixou de existir, pois este nome continuou a ser tratado com grande carinho pelos nossos valorosos desbravadores. Ainda durante os primeiros anos do séc. XX residia na antiga sede uma filha de Possidônio e Plassidina de nome Ambrosina Vargas, que era casada com major maragato Elesbão Martins, este filho de José Fidelis Martins e Meringelda Corrêa. Elesbão e Ambrosina tiveram como filhos talvez entre outros, Ipólito, Amazilia, Dinarte, Antônio, Pedro, Pedrina, Amélia e Acólia. Acólia casou-se com o poeta e escritor Clemenciano Barnasque, escritor entre outras importantes obras, “As Efemérides Riograndenses”, após o casamento Clemenciano e Acólia passaram a residir em São Sepé. Posteriormente transferindo-se para Porto Alegre.
Mas o acontecimento que talvez mais entristeceu Elesbão e Ambrosina, fazendo com que vendessem o restante da fazenda de seu Possidônio que lhes coube por herança e transferindo-se para Carazinho, foi a questão da filha Amélia, menina moça ainda tão cheia de sonhos, haver perdido a vida, quando no dia 2 de novembro do início do séc. XX, data esta consagrada aos mortos, ao transitar pelo interior do cemitério de Não Me Toque, ostentando um belíssimo conjunto com saia ornamentada com goma, usando-se para isso além de uma pequena quantidade de amido, também álcool. Assim, ao passar por algumas velas acesas, foi então a extrovertida garota, acidentalmente colhida pelas chamas, quando ao destruir suas vestes, queimando-a totalmente. Acontecido isto, a belíssima e faceira Amélia em profundo desespero, veio a falecer nas entranhas do aludido cemitério em dia de finados. Também segundo a tradição nos conta, um atento campeiro ao chegar naquele momento para também acender velas, mas ao constatar o trágico acontecimento, tomou o corpo de Amélia completamente queimado e nu, envolvendo-o em seu luxuoso pala, para efetuar o translado até sua casa onde ela nascera e passara sua infância.
No dia seguinte, o corpo da jovem Amélia Vargas Martins, transportado em uma carrocinha, puxada por uma parelha de cavalos e acompanhadas por muitos cavaleiros e por senhoras e senhoritas andando a pé, voltava para ser sepultado em outro cemitério, localizado hoje entre as cidade de Não Me Toque e Carazinho. 
Foi a partir de quando Elesbão e Ambrosina já idosos e profundamente desgostosos, transferiram-se definitivamente para o povoado de Carazinho, passando a residir onde situa-se hoje a vila Santo Antônio, onde alguns anos depois faleceram.
A Colônia do Alto Jaqui muito prosperou, conseqüentemente o povoado de Não Me Toque também, com a emancipação de Carazinho em 24 de janeiro de 1931, passou a integrar este município na condição de segundo distrito, emancipando-se em 28 de fevereiro de 1955. Assim, tornou-se cidade prospera, hospitaleira, habitada por gente de diversas origens ou nacionalidades.
Hoje em pleno séc. XXI, ninguém mais fala que um dia esta querência já foi denominada popularmente como “Não Me Toque de Seu Possidônio” ou por alguns até como “Não Me Toque do velho Possidônio”. Os tempos mudaram, mas os rumos continuam sendo os mesmos, quando a promissora terra e prospera cidade continua ser cada vez mais rica e hospitaleira, tornando-se cada vez mais Não Me Toque.

Poesia Mãe Natureza


MÃE NATUREZA - MIGUEL ARNILDO GOMES

Alem e muito alem do horizonte o que haverá?
Belos rios de águas claras, arroios ou vertentes?
Lagoas encantadas, caminhos que levam e levam pra longe,
Que giram e giram, mas quase sempre nos trazem de volta outra vez.
Depois passa um ano, um mês, uma semana, um dia, uma hora, um minuto,
Um segundo, um eterno segundo, dando-se a impressão
ao ver-se agrotóxicos serem derramados
e ao ouvir-se o ronco de moto serras, “que a própria terra esta pedindo socorro”.
Terra que esta girando, girando, girando em torno do planeta vazio,
Onde há muitas nascentes, que ao mesmo tempo estão sendo drenadas,
Onde ainda há, algumas matas que ainda restam, mas que estão sendo devassadas,
E onde ainda existem rios e arroios que correm, que correm e correm depressa,
E vão para os oceanos.
Rios que já estão secando, onde há ainda alguns peixes que asfixiados estão morrendo.
Rios que ao longo dos anos, dos meses, dos dias e das horas, vão sendo poluídos,
Corrompidos ou até engolidos pela erosão, sem prestar-se conta à natureza,
E por qual a razão? E os longos caminhos que margeiam essesrios, 
E que transpõe as matas e montes, que andam, andam e andam pra longe,
Bem longe, depressa, sem ter esperança de poder voltar.
Para onde um dia havia vertentes de águas claras, puras e cristalinas,
Para onde havia matas e pássaros saudando o amanhecer de cada dia.
“O nosso planeta esta pedindo socorro”, crianças, cresçam logo e depois corram depressa,
e nos ajudem a salvar a nossa mãe natureza,
pois esta foi a maior riqueza com que Deus nos presenteou.

Poesia Criança Abandonada


CRIANÇA ABANDONADA - MIGUEL ARNILDO GOMES

Criança que vive sem ternura,
sem Deus, sem amor, sem afeto.
Criança que vive sem poder viver,
sem ter o direito de poder chorar.

Criança que sem poder sorrir,
ainda da gargalhadas.
Criança que dorme debaixo da marquise,
ou na marginal do leito da rua.
Criança que dorme em folhas de jornais
e ali se prostitua.
Na verdade tão crua criança que sofre,
que pula, que dança, que canta para poder gritar.
Criança que vive sem ter esperança, sem paz,
sem preceitos, em tardes de sol ou em noites tão frias
sofrendo o amargor da vida vazia, sem ter direito de poder chorar.

História O Susto do Rubérbo


O SUSTO DO RUBÉRBO - MIGUEL ARNILDO GOMES

Cruzavam-se os anos quarenta, com o termino da segunda grande guerra mundial as coisas começaram então a fluir com um pouco mais de desembaraço. No estremo sul e muito principalmente na região do Planalto Médio e próspero Alto Jacuí, entre outras regiões, com o fim do ciclo da madeira, a agricultura começava a se desenvolver agora com maior intensidade. Também foi nesta década que a lavoura mecanizada começou a dar seus primeiros passos, ainda que timidamente, mas dentro de um processo gradual, a cada ano que passava, novos e novos tratores iam surgindo, das mais diversas marcas e modelos, sem que pudesse se perceber claramente, aos poucos as lavouras de trigo iam tomando conta dos antigos campos de barba de bode, campos estes, que por séculos serviram de pastagens, ainda que precariamente, mas servindo de alimento para muitos rebanhos de bovinos, ovinos, muares e eqüinos.

 Mas com o surgimento da mecanização da lavoura, mesmo engatinhando sempre novidades aos poucos iam acontecendo, como por exemplo, os fertilizantes para adubar a terra, os arados e grades niveladoras, as plantadeiras que enterravam as sementes e adubos e demais utensílios, todos estes chamados implementos agrícolas, que eram arrastados por um trator que também servia entre outras coisas, para puxar as primeiras colheitadeiras rebocadas, que inicialmente serviam apenas para ceifar e debulhar o produto.
Contudo o que causava maior admiração, era ouvir barulhos e ruídos de máquinas, o que veio mais decisivamente a revolucionar os nossos campos, pois até então, o único ronco no campo que cada individuo conhecia, era o berro dos touros, o relincho dos baguais e jumentos e ainda o ronco dos soturnos bugios em algum capão de mato.
Paralelo a estas atividades, na ânsia de também prosperar e buscar riquezas, os mandiocais alargavam ainda mais suas fronteiras, agora de uma maneira mais decisiva disputavam seus espaços. A cada ano, os agricultores adquiriam novas variedades de ramas de mandioca para serem plantadas, quando a colher uma pequena percentagem era consumida internamente,entre os planteis de bovinos e principalmente de suínos, mas a grande maioria era consumida pela industria da farinha, para isso sempre mais tafonas eram construídas, aproveitando-se as muitas centenas e até milhares de quedas d’água existentes.
Por onde que se andasse, era comum ouvir-se a distância, ruídos de roda d’água a movimentar, ralos, prensas, bem como para lavar o produto, que após ser encaminhado para o forno, se transformaria em farinha. Por isso na época naquelas imediações, não faltava emprego, que ia desde a aração, plantio, capina e mais tarde arrancação de mandioca e muito principalmente na industrialização de farinha e ainda a coleta e secagem de polvilho. Nos intervalos, a rapaziada se distraia comparecendo nas bodegas ou bolichos, onde não faltava as tradicionais carteadas de baralho, além de jogo de bochas, onde a grande maioria tinha por costume deliciar-se com a saborosa aguardente de cana, ou “canha” como era chamada, onde era servida como até hoje, nos tradicionais copos de vidro, quando a cada dose era representada como um trago e sempre ao final de cada rodada ou partida, pedia-se:
-          Por favor, sirva-me mais um trago.
No dia seguinte ainda de madrugada quando cantava o primeiro galo, já estava a peonada a postos para mais um dia de trabalho árduo, quando alguns peões, se encarregavam de carregar a mandioca e transporta-la e para isso em muitas oportunidades, teriam que suplantar difíceis obstáculos e muito principalmente atoleiros, trabalho este que se efetivava, da lavoura, até a tafona onde era o produto industrializado; transporte este que geralmente acontecia através de enormes carroções, puxados por fieiras ou ternos de bois, onde a junta do coice era engatada na carroça através de um cabeçalho, depois a junta de ligação, posteriormente a junta da ponta. A unificação entre estas três cangas, conseqüentemente entre as três juntas de bois, era efetivada através de correntes conhecidas como cambão, ou de uma peça muito resistente de couro cru torcido, a que se dava o nome de tamoeiro, quando os peões cumpriam a árdua tarefa muitas vezes enfrentando chuvas, sol, geadas e até neves, quando seguiam agitando a picana estalando o relho e falando com os bois.
Á alguns quilômetros da localidade que denominavam Barro Preto ou Guabijuzal, morava  Júlio Severo, mais conhecido como Ruberbo, rapaz dinâmico e trabalhador, que era filho por adoção de um casal muito estimado, que residiam já por alguns anos naquelas imediações, onde Ruberbo se criou trabalhando na agricultura, na plantação, capina e arrancação de mandiocas e por vezes até em lavouras de arroz d’água, erguendo taipas e virando leivas através do arado americano, ao final efetuando o corte, trabalho este que também era praticado manualmente, mas em épocas de farinhada, Rubérbo sempre dispunha de tempo para o serviço na própria indústria. Quando o verão cruzava e entrava-se no outono, o povo já se preparava para mais uma safra de farinha, a qual tinha-se por normas começar no início do mês de maio, trabalho este que se estenderia até o final de julho, suspendendo-se no inicio de agosto, por ser considerada já, a fase de rebrotas, mas sempre foi esta fase em atividade da industria da farinha o período em que os agricultores, tafoneiros e peões, mais ganhavam dinheiro, o que costumava dizer, mais se niquelava.
Numa oportunidade já em um final de quaresma, período este que segundo a religiosidade, considerada por todo o mundo cristão, como os dias de maior devoção, quando celebra-se o mistério da paixão e morte de Nosso Senhor Jesus Cristo e posteriormente a vossa Ressurreição. Como naqueles tempos vivia-se mais intensamente aqueles dias, quinta e sexta-feira da paixão, os agricultores guardavam então suas ferramentas de trabalho, passando a viver exclusivamente para Deus, participando da Vias Sacras e ainda do ato de adoração do Cristo crucificado. Como para muita gente, mesmo respeitando a Deus acima de todas as coisas, conseguia fazer uma mistura de religiosidade com superstição, conhecendo aqueles dias, como sendo quinta e sexta feira maior e acreditando que naquele período, como Jesus estando morto, o demônio se soltava e saia a noite atacar as pessoas, que por uma necessidade ou outra, precisassem sair.
Em uma certa sexta feira santa, enquanto centenas de fieis faziam suas penitências, ao reunir-se em torno das capelas, um grupo de amigos contrariando a todos os princípios a que se pode imaginar, decidiram em comum acordo procurar uma carteada, para isso não foi preciso hesitar, logo foi escolhido o local, que seria a bodega do Agenor, pessoa idônea que procurava tirar o sustento para sua família, de um pequeno estabelecimento comercial, situado a poucos metros do local conhecido como; Serrinho do Térezio. De inicio a conversa foi amena quando falava-se devagar, como que pedindo-se perdão, pelo fato de haverem procurado uma jogatina naquele dia santo, que na concepção de todos, teria que ser dedicado apenas a penitencias e orações. Logo em seguida para esquentar o clima, pediram um trago e a seguir mais um trago de canha, quando neste embalo o alcezito de nove ou pife começou a correr solto durante toda tarde, entrando-se noite adentro, tudo isto entre um trago e outro, mas quando suspenderam o jogo, atendendo-se a um pedido do proprietário e já embalados pelo efeito do álcool, só ai então pressentiram a grande asneira que haviam cometido.
 De uma hora para outra, voltaram a mudar o tom de voz e recomeçaram a falar em voz baixa, quando a conversa girava em torno de planos para os meses seguintes e do trabalho difícil que estaria para acontecer. Na medida em que os mais eufóricos contavam pausadas histórias, entre todos os participantes destacava-se Rubérbo, filho adotivo do Seu Timóteo e de Dona Josefa, que na condição de rapaz esclarecido, falava das proezas que um dia havia praticado, quando servira em um regimento de cavalaria na cidade de São Gabriel, quando participara inclusive de manobras militares das mais importantes, falava ainda das belas moças, que tivera oportunidade de conhecer na terra dos marechais. Porém quando chegou a meia noite, aconteceu novamente uma pausa, quando todos foram unânimes em afirmar serem pecadores, quando alguém entre o grupo ponderou, que com certeza Jesus lhes compreenderia e iria lhes perdoar, pelo fato de estarem àquela hora em uma mesa de jogatina, naquele dia tão sagrado e importante para o cristianismo. A seguir despediram-se e cada um tomou o rumo de seu lar, não havia lua e a noite era por demais escura, Rubérbo caminhava sozinho na calada da noite e teria obrigatoriamente que cruzar pelo Guabijuzal, ou Barro Preto, onde havia um pontilhão e ainda uma encruzilhada e que segundo comentava-se, por pessoas que não costumavam a mentir e que cruzando por aquele local em noites de sexta feira, haviam se dado de cara com o lobisomem e que até mesmo o Boi Tatá, já havia sido visto por aquelas imediações, o que era testemunhado por pessoas da verdade e sérias. Rubérbo naquele instante, quando apenas o canto do grilo e o coaxar das rãs quebravam o silêncio da noite, começou a imaginar tudo isso, lembrou ainda que teria que passar também pelo Angico Torto, onde gaudérios caminhando à noite teriam se deparado com terríveis assombrações, inclusive o Saci Pererê, já havia saltado em certa ocasião na garupa de um ginete que por ali cruzava. Quando ainda ao lembrar, que sua casa estava um pouco distante, mas que deveria confiar no taco, pois era ele Rubérbo, considerado um recordista em corridas a pé, o que o tornara famoso desde os tempos de quartel. Primeiro ouviu um berro de touro a grande distância, quando o rumo parecia ser mais ou menos, o da casa de Seu Belizário, na encosta do rio, a seguir mais um berro que ele constatou estar já bem mais próximo, quando o corajoso rapaz, mesmo assim começou a sentir um arrepio que começava no cangote e na medida em que lhe correndo, pela espinha dorsal, o mesmo chegava-lhe ao calcanhar. Foi nesta condição então que Rubérbo não parou para pensar, de um momento para outro passou a desferir violenta disparada e quanto mais corria, mais o berro se aproximava, a certa altura já na ânsia de escapar, sentira que o bicho quase lhe pisava no garrão, chegou a sentir um sopro no pescoço, que só parou quando Rubérbo alcançou o pátio e entrou varanda adentro. Depois deste susto do Rubérbo, episodio este que se tornou por demais conhecido, nunca mais alguém ouviu falar por aquelas bandas, que chiruzada alguma se reunisse nas sextas feiras santas em algum bolicho, para participar de jogatinas e tomar tragos.

Poesia Meu Padrinho São Miguel


MEU PADRINHO SÃO MIGUEL - MIGUEL ARNILDO GOMES


Como o filho de centauro ele nasceu
Neste mundo que foi seu
Carregado de esperanças
De verdes sonhos floresceram as campinas,
Moldaram-se as cavatinas,
No frondejar da existência.

O sinhozinho foi levado a igrejinha,
Nos braços de sua madrinha
Recebido com carinho.
A sua mãe vestida com o supremo manto
Convidou o próprio santo,
Para ser o seu padrinho.

“A benção! Meu padrinho São Miguel!”,
“A benção! Meu padrinho São Miguel!”.
A sua benção pedia vô sinhozinho,
Que encontrara em São Miguel,
Seu protetor, seu padrinho.

Pelas planuras e sagas dos descampados
Sinhozinho foi criado,
Domando e semeando amor.
No próprio culto, a devoção mais fiel,
Encontrou em São Miguel
Seu eterno protetor.

Poesia Vôo de Andorinhas


VÔO DE ANDORINHAS - MIGUEL ARNILDO GOMES

Andorinhas voam em bando,
perdida há uma só.
Habituam-se a dizer,
que sozinha não faz verão.
Um só vôo de andorinha
é a réplica da solidão.
Somente o vôo coletivo
alucinante e altivo
sintetiza integração.
Entre montes e horizontes,
da morte buscando vida,
perdida voa uma só.

Muitas asas se agitam,
no anseio de ser feliz.
Junto à torre da matriz,
ou sobre o teto dos galpões.
Num lenitivo de emoções,
num caracol que se estiliza,
neste adorno que simboliza,
a analogia da paz,
a beleza mais primaz.
Talvez busque-se o infinito
no vigor sereno e bonito
para um rimance de mil canções.

Ao findar a primavera,
saudando outra estação
surgem em arribação
quebrando a monotonia
A formar a sinfonia
no painel desta versão.
Na magia da ilusão
que consegue ser mais linda,
nesta beleza infinda
são milhares de andorinhas,
porque uma voando sozinha
nunca, nunca faz verão.

Poesia Sonhador


SONHADOR - MIGUEL ARNILDO GOMES

Madrugada deserta sem poncho ou cobertas
Minha mente desperta sob céu tão azul
Uma estrela caliente a me iluminar
Pronto a me guiar o Cruzeiro do Sul

A ficção me revela ao abrir-me a janela
No poema aristocrata me torno sonhador
Qual pássaro voador richador sem ser triste
Não querendo impor limites a esse mundo de amor

Se te pisei em cima, pelo poder da rima te peço perdão
Minha irmã, meu irmão, até quando acertei,
Ou mesmo quando errei, se agi pela razão ou pelo coração?
Se sigo meu instinto, não sinto, não falo,
Ao tranco do cavalo da inspiração.

São tantas as injustiças de ódio e cobiças
Gerando agruras entre multidões
Quais estrelas no céu e que fossem contadas
Quando enumeradas dariam milhões e milhões

Hoje setuagenário neste mundo arbitrário
Que absorve ou condena, a pensar tenho pena
E torno- me silente, sinto em minha mente
Quando ponho-me a pensar que só pode julgar o Deus onipotente.

Ao senhor bom pastor guia e protetor
Nossa fé, nossa luz, oh imutável patrão
A sua proteção para um mundo de paz
Aqui somos iguais, somos todos irmãos.

História Vaqueanos ou Tapejaras


VAQUEANOS OU TAPEJARAS - MIGUEL ARNILDO GOMES

Atingia-se quase o final da primeira metade do século XX, a agricultura no Rio Grande do Sul, intensificava-se a cada safra, com relativo aumento de produção.
Os agricultores, porém, quando na sua absoluta proporção, já dependiam de uma reduzida área de terras para poder sobreviver, a cada ano, nas mais variadas zonas e das mais diversas regiões agrícolas do estado, a falta de espaço para que se pudesse produzir, já começava a evidenciar-se.
Quanto ao fator escolaridade, cada vez mais se tornava patente, em qualquer recanto, a cada ano aumentava o número de educandários, a nível municipal ou até particular, quando a raras exceções, as crianças a partir de oito anos eram matriculadas estudando desde a primeira, até a conclusão da quarta série, que acontecia geralmente depois dos doze anos, quando eram aprovados, ao participarem de provas em finais de ano.
Uma vez concluído o curso primário, eram também tidos como aptos a enfrentar nos seus mais diversos níveis, a vida na roça. Era comum ouvir-se de um pai, ou de uma mãe assim se expressar: - O meu filho, já completou o curso primário, para se defender já aprendeu o suficiente, agora sem mais nada ter como obrigação, vai ter que pegar a enxada e trabalhar ao nosso lado, para aprender como o alimento, no dia –a –dia, chega a nossa mesa.
   Como haviam raríssimos privilegiados, que ao descender-se de pais em condições financeiros superior, eram estes matriculados em colégio em regime de internato, até a conclusão do curso ginasial, deixando-se o curso médio e até superior, para raríssimas exceções.
As famílias naquela época constituíam-se a partir de dois, até treze em casos especiais chegando a quatorze ou quinze filhos.
No interior do estado mais meridional e principalmente nas regiões de colonização, as propriedades cada vez mais se apequenavam, a população somava-se e até multiplicava-se em fração de uma década, quando surgia a questão, quem casa quer casa, mas para quem trabalha na terra, quem casa também quer terra e assim procedia-se, quando jovens casais decidiam adentrar no processo familiar, cada vez mais sucessivamente, passavam a depender de uma menor partilha de terras para que nelas pudessem produzir o suficiente, quando mesmo ao compor um sistema de vida modesta, viriam inevitavelmente a usufruir as mínimas condições de sobrevivência.
Planejar o número de filhos salvo em alguns casos tornava-se impraticável, pois controlar a natalidade até então, fugia aos conceitos básicos da família e aos princípios religiosos, se já existiam alguns métodos anticoncepcionais, estes não eram divulgados.
  Quando alguém audaciosamente, tomava a liberdade de perguntar a um casal de noivos, com relação ao número de filhos, que ao casar pretenderiam ter, a resposta chegava a ser uma unanimidade ao partir da moça: - Isto depende de Deus, quantos Ele nos der! Relação sexual antes do casamento naquele tempo constituía-se como prática a imoralidade, por considerar-se este ato, violável aos preceitos tanto da ordem familiar, quanto da própria sociedade. Também a questão da virgindade tornava-se uma afirmação dos deveres da mulher, quanto à honra e dignidade, pois a moça que não permanecesse virgem até o momento sagrado do matrimônio, segundo os bons costumes, não estaria digna de ao receber o sagrado sacramento, vestir-se de noiva com véu e grinalda.
Quanto ao homem, seguindo idênticos padrões religiosos, pregava-se o mesmo conceito, mas raramente obedecendo-se, sendo comum, rapazes a partir de dezoito anos, já serem vistos freqüentando casas de prostituição.    
Naqueles tempos no extremo sul, a agricultura quase na sua totalidade, ainda voltava-se para o regime de economia familiar, eram os produtos depois de colhidos, cuidadosamente secados e armazenados em diferentes tuias, ao ser destinados para o consumo da família, comercializando-se os excessos, não se relacionando entre esses, a mandioca, quando se tinha por normas, destinar-se à parte principal para a indústria de farinha ou de fécula, deixando-se para o consumo interno, a menor parte.
Esta agricultura de ordem familiar originava-se de pequenas propriedades e vinham obrigatoriamente acompanhados de uma mini-pecuária e avicultura, sendo também os produtos desta origem, na sua parte principal consumidos internamente, comercializando-se o restante, além de alguns derivados.
Nos finais de semana, principalmente aos domingos e dias santos, as famílias de agricultores reuniam-se em comunidades, principalmente em torno das capelas, quando os jovens, moças e rapazes, participavam ativamente de jogos de prendas e reuniões dançantes, diversões estas que vinham obrigatoriamente antecipadas, pela oração do culto ou da santa missa, cerimônias estritamente dirigidas aos membros da Comunidade Católica, mas que em determinadas capelas, tinha-se como hábito, receber jovens praticantes de outras tendências religiosas.
No afã de participar da diversão e lazer, ao compor um só rebanho, irmanavam-se, quando ao serem convocados adentrar a Igreja, fazia-se pela ordem, obedecendo-se as seguintes normas: homens, rapazes e meninos, ao ingressar, iam tomando posição pela ala direita, cabendo às mulheres casadas, moças e meninas ocupar o espaço na parte lateral esquerda da Igreja. Conta-se que em certa oportunidade, Laurinho, filho primogênito de D.Tereza, ao se encontrar tremendamente apaixonado por Luzia, filha de Seu Augusto, cometera o ato de rebeldia ao tentar acompanhá-la, posicionando-se por entre as mulheres, fato este digno de registro e considerado de total indisciplina por parte dos fabriqueiros, quando puxado por uma orelha pelo senhor Genaro, foi o moço orientado a ocupar o lugar que por direito lhe cabia, situando-se por entre os homens.
Nas mais diversas regiões agrícolas, as colônias eram formadas a partir das mais variadas raças e origens de imigrantes, por onde os mais diversos sotaques fundiam-se, entre eles, germânicos, italianos, poloneses, ucranianos, africanos, mas englobando-se entre esses, grande número de descendentes portugueses, espanhóis e alguns de origem nativa, que ao entrosar-se, passavam a adquirir mais ou menos os mesmos hábitos, ao ser derivados na maioria das vezes de famílias numerosas, passavam a compartilhar das mesmas teorias e ensinamentos, obedecendo-se os mesmos conceitos.
Quando os padres a uma vez por mês deixavam as paróquias, dirigindo-se as capelas para rezar a santa missa, realizava-se constantemente batizados, e esporadicamente alguns casamentos, pois estes se obedecendo a um outro conjunto de formalidades, eram geralmente celebrados na Igreja Paroquial, cerimônias estas, que na maioria das vezes, contava com um relativo número de convidados, quando processavam o acompanhamento aos noivos, de ida e volta, transporte este que acontecia, através de carrocinhas toldadas, diligências charretes e até em carrocerias de caminhões, quando os noivos faziam jus a estas homenagens, cabia aos pais, como até os dias de hoje, agraciar aos nubentes, bem como aos convidados, com uma grande festa de confraternização.       
Uma história pitoresca que despertou grande comoção, que ainda hoje é transmitida de pais para filhos e de avós para netos, pelo fato de ter acontecido no salão de bailes do Seu Jerônimo, quando o rapaz de boa índole chamado Valdemar, cometeu o ato inaceitável e de extrema imoralidade, ao beijar em plena pista de dança, a sua namoradinha Verônica, sob os olhares incrédulos de dezenas de participantes.
Na segunda-feira seguinte, foram Valdemar e Verônica na companhia dos pais e do comissário, levados até a delegacia de polícia da cidade, quando uma vez o fato registrado e comprovado, foram encaminhados ao cartório, aonde sem honras e saudações aconteceu o casamento.
A cada ano que passava, mesmo ao se adquirirem novas técnicas, as propriedades mais se fragilizavam, pois sempre ao casar um filho homem, os pais tinham como obrigação, tirar um pedaço de terra que lhes pertencia, para ajudá-lo a dar o primeiro impulso. Terra sobrando existia em largas proporções, em qualquer região, mesmo quando poderiam tornar-se produtivas permaneciam na ociosidade, ao continuar entregues a grandes proprietários, que exploravam até então, pequenas partes. Foi em tais circunstâncias, que começou o chamado êxodo rural, quando jovens provindos das mais diversas regiões agrícolas, impregnados pelo sonho de uma vida mais digna, ao deixar se elevar pela fantasia de um salário justo passavam a incorporar as vilas cada vez mais pobres, das pequenas e grandes cidades.
Foi também neste período, que alguns conhecedores de caminhos, vaqueanos ou tapejaras, quando na ânsia de procurar ajudar, começaram a introduzir entre os colonos das mais diversas zonas produtivas, a concepção de que nas regiões sudoeste e oeste, entre outras regiões do estado do Paraná, existiam verdadeiros sertões a serem desbravados, o que seriam de terras extremamente férteis, que uma vez colonizadas, com toda a certeza tornar-se-iam extraordinariamente produtivas. Foi nesse espaço de tempo, que principalmente jovens casais de produtores, agora num processo bem mais acentuado, passaram a vender suas pequenas propriedades e influenciados pelo desejo de oferecer um futuro mais promissor a seus filhos.
Neste decurso, uns deixando a serem elevados pelos outros, aconteceu a debanda de dezenas de milhares de famílias gaúchas, que davam adeus a seus familiares e amigos, ao transferirem-se num gesto de profunda grandeza, passavam a habitar junto a muitos nativos e não menos bravos pioneiros, que paralelos a milhares de proprietários de serrarias, que efetuavam o corte e beneficiamento da madeira, já introduziam nessas regiões promissoras, uma agricultura que muito rapidamente passou a ser modernizada e voltada para um processo de desenvolvimento extremamente acelerado.
Assim vivendo em outra situação determinante, podiam os novos habitantes acordar em todas as manhãs, ouvindo o canto sonoro da gralha azul, a ave símbolo do estado das araucárias.
Por entre os belos pinherais, formaram-se vilas, que passaram a desenvolver-se num segmento de extrema rapidez. Figurando por entre esse processo de transição, uma série de acontecimentos digna de memória decorrente das mais diversas circunstâncias, algumas que tiveram como causa determinante e até curiosa, foi à história de Antério, peão de estância, que tomado pela ânsia ao ver a sua prenda partir, tomou a decisão mais corajosa, soltou seu cavalo num fundo de invernada, ao colocar seus pertences em uma mala de garupa, pegou carona na carroceria de um velho caminhão, tomando o rumo do Paraná, onde impulsionado por um duplo prazer, fez com que deixasse pedaços de sua bombacha, dependurados nos espinho dos pés de unhas- de- gato, da nova terra, onde ao lado de tantos outros abnegados agricultores, ajudou a fazer parte deste decurso.
Dentro desta proporcionalidade, foram muitos os gaúchos e bem aventurados agricultores, que alcançaram através do suor de seu trabalho, a glorificação de ter participado, da afirmação agrícola das regiões sudoeste, oeste e até noroeste deste estado, onde foram tantos os Joãos, as Marias, os Osvaldos, as Letícias, entre milhares de tantos outros nomes, que ajudaram e que ainda hoje continuam fazendo, com que índices de produtividades, alcancem níveis jamais atingidos em outras regiões agrícolas do país.
Hoje aí está a resulta das sementes que foram semeadas, que geraram frutos, também hoje aí estão, os descendentes desses agricultores, que num esforço comunitário formaram vilas, por entre estas terras produtivas e férteis, muitas destas vilas se desenvolveram, tornando-se grandes cidades, que muito orgulham aos paranaenses, que por demais contribuem, através do comércio, da indústria, entre outros setores, para o engrandecimento cada vez maior deste estado.
Neste pouco mais de meio século, por aí estão, ainda entre alguns deles, filhos, netos e até bisnetos destes destemidos agricultores, que um dia nesta terra, também propuseram-se a plantar a fé e a esperança em dias melhores, viajantes que ao chegar tiveram como porta de acesso, para a grande parte do sudoeste e na maioria das vezes também para ao oeste, a querida e hospitaleira Clevelândia, que na condição de uma menina sorridente ao dar boas vindas, acenava a todos aqueles que por este portal transitaram, e entre todos esses, alguns viajeiros que também nesta terra erradicaram-se, campeiros, colonos e citadinos que ao juntar-se aos valorosos nativos e também aos pioneiros destas regiões, a recomeçar a partir daí bem mais acentuadamente, um intercâmbio cultural, que já a tempo se desenhava e que agora passara a se definir entre o Rio Grande do Sul e o Paraná.  
Hoje estão aí na sua absoluta maioria, os descendentes destes sonhadores, são os agricultores, mas são também os moradores das inúmeras cidades, que compõe principalmente a região sudoeste e oeste paranaense, que ao unir-se, imbuídos pelos mesmos princípios e objetivos, continuam a ser também, descendentes dos velhos chimangos ou maragatos, gremistas ou colorados, viajantes ou oriundos destes, mas ao tornarem-se conhecedores de caminhos, voltam a transformarem-se em vaqueanos ou tapejaras e daí a insígnia, que um dia prazerosamente oferecemos a uma entidade tradicionalista da região, que ao tornar-se notória, passou a ser adotada como lema:
Se o ideal deles foi descobrir caminhos, prossigamos nesta caminhada.

Poesia Vida de Balseiro


VIDA DE BALSEIRO - MIGUEL ARNILDO GOMES

(à memória de meu amigo Dionísio Prestes e outros balseiros do Rio Uruguai)

Neste meu santo eu dei um banho lá na sanga
para que desse enchente ainda essa semana.
São Pedro atendeu o meu pedido e ainda hoje,
sigo no rumo de Uruguaiana.

Choveu, choveu, e o rio encheu,
Tarugos e gravatas que se prendem,
balsa que desliza e que se vai
e que segue embalando sobre o leito
do velho Rio Uruguai.

Rema pra o lado de Santa Catarina, companheiro,
rema parceiro pra banda do Rio Grande,
Lá vai a balsa!
Nos leva à correnteza deste rio,
se Deus quiser, nos traz de volta a Maria Fumaça.

Balseiro empleiteiro deste rio onde é minha lida,
meu mundo, minha vida.
Cuidado com a enseada grita o observador,
Ao desviar a fortaleza, proezas de remador.

Rema pra o lado da Argentina companheiro,
Rema parceiro, pra banda do Rio Grande,
Lá vai a balsa!
Nos leva a correnteza deste rio,
se Deus quiser, nos traz de volta a Maria Fumaça.

Poema Voltando à Palmares


VOLTANDO A PALMARES - MIGUEL ARNILDO GOMES

Pela paz, gerações se sucedem,
nos quinhentos anos.
Na alegria, esperança, tristeza,
sonhos e desenganos!
Na euforia de um povo que canta,
para querer ser feliz!
As razões serão sempre as mesmas,
neste meu País!

Igualdade ao homem de cor.
A lei Afonso Arinos ecoou por aqui,
caminhando para um mundo de amor,
vamos voltar a Palmares,
e outra vez, Zumbi.

Palmarinos que foram símbolo da libertação,
na poesia, canto e poder da inspiração.
Na magia das asas de um pássaro que voou demais
Alcançando talvez o infinito,
em busca da paz.

Poesia Brasileiro, sim senhor.


BRASILEIRO, SIM SENHOR - MIGUEL ARNILDO GOMES


Como a rebrotar do passado
De uma vertente que jamais se apaga
Meu intelecto se indaga
Com natural propensão,
Sem viola ou orquestração
O verso nasce da espontaneidade
Acordando as sonoridades
Do canto que se produz
Meu perscrutador se comove
Sou nascido em trinta e nove
Quase idos de quarenta.
Quando a razão se afugenta
E o bom senso se emperra
O Brasil entrou na guerra
Pela concepção que não foi minha
Onde tombaram nossos pracinhas
Além do oceano, muito além fronteira
Onde tremularam a nossa bandeira
Mas hoje pergunto por qual a razão?
Pelo soldado mal alimentado ou sem ração?
Pelo pracinha que morreu com frio e sedento?
Mais se faltar ainda outro argumento,
Pela interferência de um “amigo” país?
Ou pelas honras militares e gloriosas biografias?
Quando se conclamava o que ainda se dizia,
Que o nosso povo ainda era tão feliz.

Poesia Reminiscência


REMINISCÊNCIAS - MIGUEL ARNILDO GOMES

Quando ainda me parece que foi ontem
Em verdes sonhos cruzei toda a minha infância
Como uma tropa descambando além dos montes
E com bruacas carregadas de esperanças
De ser feliz e de um dia ser alguém.
Na cabaleta da ária que não findou
Neste autismo quando vai e quando vem
Da fantasia que a insciência “reculutou”. 

Acolherando uma parelha de porongos
Como rescaldo de um borralho que se foi
No linear desta trilha não me alongo
Para formar a mais bela junta de bois

Como amigos o fulano e o cicrano
Já com bonecas brincava a fulaninha
Da lagoinha foi meu mar, meu oceano
Desde a ficção pra verve que se encaminha
Fiz de taquara o tordilho e o alazão
Até o relho retirei da própria flor
O fiz brotar dos bretes do coração
Reminiscências de um recanto só de amor.

Poesia Fantasismo


FANTASISMO - MIGUEL ARNILDO GOMES

Veja que lindo potreiro
produzido com lascas de pinheiro
com portão de tábuas de angico,
no entalhe adornado e tão rico
veja que lindo potreiro.

Veja que belo terneiro
jubiloso, tão nobre e faceiro,
a sua função desempenha
mamando o que sobrou da ordenha,
veja o mais belo terneiro.

E aquela avezinha
abrindo o compasso
buscando o espaço
por entre outras que se alinham.
São formosos pássaros migrantes
outrossim, ilustres visitantes.
Talvez queiram seguir no rumo dos titãs
que chegam as noitezinhas,
mas depois, somem pelas manhãs.

Poesia Amor


AMOR - MIGUEL ARNILDO GOMES

Esta palavra não esta na egolatria,
ou na maravilha da fascinação,
não pintou-se na tela da mendacidade,
ou mesmo teve alguma outra definição.
Sabe-se que o amor existe,
mas ninguém sabe de onde veio com exatidão,
Talvez tenha surgido do murmúrio dos ventos,
como uma luz no esplendor do firmamento,
Talvez tenha brotado da paz de Deus,
ou da própria sensibilidade do coração.

Poesia Dissertação


DISSERTAÇÃO - MIGUEL ARNILDO GOMES


O homem já vem ao mundo
Desprovido de egoísmo
Sem preconceito ou racismo
Vê todas as coisas iguais
Vê os semelhantes e os irracionais
E gradualmente vai se adequando
Ao meio que esta vivendo
Desprezando a simetria
Pela vida desregrada e vazia
Abandona os mananciais.
O homem já nasce pelo amor
No ato da fecundação
Mas sem fazer ostentação
Torna-se ancho e divergente
Inconsiderado e incoerente
Desde os tempos de menino
Observando o mundo pela luxúria
Concedendo vazão as injurias
Que evidenciam-se no momento
Contrariando-se os dez mandamentos
Que foram traçados pelo divino.
Até Ele Jesus Nazareno
O incontestável e fiel Augusto
O único justo entre os justos
O proclamador poderoso
O irrepreensível e majestoso
A nós pregou igualdade
Pedindo-nos respeito entre os seres
Dissertou nossos deveres a nos pedir paz, amor e humildade.